O que fazer com o real?
Ana Teixeira espalhou mensagens por email e pela USP, à procura de desocupados. E muita gente veio bater na porta do Paço, se oferecendo para se ocupar. Mas Ana Teixeira não quer ocupar ninguém, está interessada em esculpir o tempo, desenhando os desocupados enquanto eles se distraem com escritos de Tarkovsky e filmes de W. Herzog. Armou uma “armadilha”, um espaço sedutor para atrair os atarefados, com tapete no chão e gancho nas paredes para pendurar a bolsa, as chuteiras e as sapatilhas. Os desocupados, quando se dão conta de que tudo não passou de falha na comunicação, não se interessam em se jogar nas almofadas. Dão meia volta e se vão. A mim, ela ganhou. E, depois de me jogar na almofada, contou sobre outro ruído de comunicação que aconteceu com ela no final de semana passado. Um “mal-entendido”, segundo o delegado do 5º DP, onde ela foi parar por causa de seu trabalho de intervenção urbana “Outra Identidade” (ver maiores detalhes em matéria publicada no jornal Folha de SP). O evento da feirinha do Bexiga é curioso porque parece ter acontecido ali uma paranoia coletiva de perda da identidade. Mais ou menos o que acontecia em determinadas tribos indígenas diante das câmeras fotográficas, no final do século 19. Medo de perder a alma, a identidade. Mas o projeto “Procuram-se desocupados” tem disso. Lembra o tempo livre e improdutivo que acontecia na cama de gato de Regina Johas, na Ocupação 1. Na sala de estar da Ana Teixeira, rimos, comentamos e achamos legal o fato de a arte ir parar no caderno Cotidiano, ao invés da Ilustrada. Raro ver a arte sair dos terrenos que lhe são destinados e entrar na vida cotidiana das pessoas.
What to do with the real?
Ana Teixeira spread messages by email and around USP, looking for people who were not busy. And a lot of people came knocking on the door of the Paço, offering themselves to be given something to do. But Ana Teixeira does not want to occupy anyone, rather she is interested in sculpting time, drawing the people at leisure while they amuse themselves with Tarkovsky books and W. Herzog films. She set up a “trap”, a seductive space to attract busy people, with a rug on the floor and hooks on the walls to hang up one’s bag, boots and slippers. The people who are not busy, when they realise that there has been a breakdown in communication, are not interested in throwing themselves down on the cushions. They walk around and leave. When I went in, she won me over. And after throwing myself down on the cushion, she told me about another communications fuss which had happened the previous weekend. A “misunderstanding”, according to the police chief of the 5th Precinct, where she ended up due to her urban intervention work “Other Identity” (see more details in the article published in the Folha de São Paulo). The event at the Feirinha do Bexiga is curious as it seems that there occurred some kind of collective paranoia of identity loss. Something similar to what happened amongst certain indigenous tribes in front of photographic cameras in the late 19th century; fear of losing one’s soul, one’s identity. But the “Seeking Idle People” has something of that too. It reminds one of the free and unproductive time that occurred in Regina Johas’ cat’s cradle, in Ocupação 1. In Ana Teixeira’s living room we laughed, remarked and thought it was great how art could end up in the sketch pad of everyday life, instead of that of illustrations. It is rare to see art leave the terrains which are designed for it and enter people’s everyday lives.